5 de abril de 2019

Venda Indireta do Etanol: Entulho Regulatório

Entulho é aquilo que já não mais nos serve. Seja por ser o resquício material de alguma operação maior, como os resíduos de uma construção; seja pela obsolescência de algo que nos serviu, mas que perdeu sua utilidade, como um velho walkman.

O uso do etanol combustível no Brasil teve impulso com o PróÁlcool, programa da década de 1970, surgido em função das sucessivas crises do petróleo, com a finalidade de promover substituição dos combustíveis derivados de petróleo.

À época, como ainda era incipiente o número de automóveis movidos a álcool, uma das formas encontradas pelo governo para dar escala à produção foi exigir a mistura de etanol anidro à gasolina. Assim, à exceção dos automóveis movidos à diesel, todos os demais passaram a usar etanol, direta ou indiretamente.

As distribuidoras, que são atravessadoras entre os produtores (refinarias e usinas) e as revendedoras (postos de combustíveis), passaram a ter essa tarefa. Assim, a par de realizar a mistura do etanol anidro com a gasolina, as distribuidoras passaram também a monopolizar a venda do etanol hidratado (etanol “comum”). Esse é o mecanismo da venda indireta do etanol, exigido pelas Resoluções 43/09 e 41/13 da ANP.

Se, com relação ao etanol, a função das distribuidoras se resume a misturar o etanol anidro com a gasolina, por qual razão todo o etanol produzido ainda passa por estas distribuidoras?

Tal mecanismo é perverso e injustificável.

É ambientalmente sujo e socialmente injusto, pois veda que as cidades produtoras de etanol, que sofrem com efeitos nocivos das usinas, usufruam da vantagem de preços daquilo que é produzido em seu próprio quintal, vez que o etanol viaja para distribuidoras localizadas em grandes centros para simplesmente “passar” por elas e voltar aos postos, exigindo uma quantidade enorme de caminhões, sujando nosso ar, lotando nossas já combalidas rodovias e onerando o etanol com fretes que poderiam ser evitados.

É economicamente ineficiente, pois obsta novos arranjos concorrenciais entre os atores do mercado local, que poderiam desonerar a operação e oferecer um produto mais barato ao consumidor.

E é juridicamente inconstitucional, pois fulmina o princípio da reserva legal (art. 5º, II, CF), uma vez que inexiste lei fixando tal obrigação; e hostiliza os princípios constitucionais da livre iniciativa e da livre concorrência (art. 1º, IV e art. 170, IV, CF).

Completamente obsoleto, o mecanismo da venda indireta do etanol é um entulho regulatório a ser removido o quanto antes, a fim de propiciar melhores preços ao consumidor.